domingo, 17 de outubro de 2010

diário de georgios

...o meu pai escrevia diário, às vezes leio sem no entanto, ter a preocupação de entender:

a obra de offenbach está numa crise de morte, livrou-se de tudo o que era superficial e deixou a verdade aparecer. É o que ouço quando ando de metro por paris e ouço o ambiente e vejo as luzes, enquanto vou buscar a minha mulher, relembro quase nota a nota uma parte de la Périchole e encontro-me a sorrir enquanto escrevo estas linhas.

depois de se terem conhecido no chiado, os meus pais tomaram o comboio para paris onde a minha mãe arranjou trabalho num restaurante como ajudante de cozinha e o meu pai andava pelas ruas à procura de sabe-se lá o quê. Conseguia sempre encontrar alguém que a troco da companhia lhe pagava a refeição e o deixava por vezes com alguns trocos. Era ele que fazia as compras para casa e preparava as refeições para a minha mãe de forma a que ela não tinha que fazer rigorosamente nada em casa. Ele ía sempre buscá-la ao boulot.

estavam muito apaixonados.

sábado, 16 de outubro de 2010

fim-de-semana

tenho o cabelo encaracolado e preto como o de giorgios e sou alta, mais alta do que a minha mãe.

da minha mãe herdei o gosto pelo campo, do meu pai herdei o gosto pelos livros. Há um poeta da minha eleição de quem sei muitos versos de cor e uma frase que me ocupa a mente, durante muito tempo:

a mentira é uma verdade adormecida.

deve ser verdade. O dia está a começar e quase todas as cidades têm um poeta e o de alexandria é kavafis.

alexandria, onde fui, à procura do meu pai, é a minha cidade secreta.

é onde me encontro no silêncio.


a ilha das magnólias




sexta-feira, 15 de outubro de 2010

o meu diário

...chamo-me julia saridis e vivo no alentejo em montemor o novo. O meu pai era (faleceu o ano passado) um grego de alexandria que se tinha apaixonado por uma portuguesa morena.

foi em 1944 no fim da guerra e o meu pai passou por lisboa, havia rumores que se esperava walter benjamin em Lisboa e georgious saridis era um intelectual aventureiro que a caminho de londres resolveu parar em lisboa e daqui nunca mais saíu.

a minha mãe trabalhava na altura a servir a copa do café brasileira, no chiado.